terça-feira, 23 de julho de 2013

Médico americano questiona a relação entre obesidade e diabetes tipo 2

Para Peter Attia, o pior inimigo da saúde pública nos países ocidentais é a resistência à insulina, e não o sobrepeso.
Peter Attia durante sua palestra em abril: causa e
 consequência invertidas
Para 99% dos médicos, não há dúvidas. A relação entre os temas é mais do que bem estabelecida nos manuais de medicina: falta de exercício aliado a excesso de comida leva à obesidade e por consequência, em muitos casos, ao diabetes tipo 2. Mas o americano Peter Attia resolveu nadar contra esta corrente.

“Apesar de me exercitar de três a quatro horas por dia, seguir a pirâmide alimentar à risca, ganhei muito peso e desenvolvi algo chamado síndrome metabólica. Alguns de vocês devem ter ouvido falar dela. Me tornei resistente à insulina”, afirmou ele em uma recente palestra no ciclo TED MED, que aconteceu em Washington DC, nos Estados Unidos, em abril deste ano. 


As células do corpo de Attia ficaram cada vez mais resistentes ao efeito da insulina, o hormônio produzido pelo pâncreas humano para controlar a quantidade de açúcar no sangue e ele acabou engordando. “Uma vez que você fica resistente a insulina está no caminho para ficar diabético, que é o que acontece quando seu pâncreas não consegue mais fazer insulina suficiente para lidar com a resistência. Então os níveis de açúcar no sangue começam a subir e uma cascata de efeitos patológicos saem do controle, podendo levar a doenças cardíacas, câncer e até Alzheimer”, explicou ele. 



A tese de Attia é que a relação de causa (obesidade) e efeito (diabetes) é a contrário da imaginada pela maioria dos médicos. “Obviamente, então, se você quer tratar a resistência à insulina, você faz a pessoa perder peso, correto? Você trata obesidade. E se a obesidade não for a causa da resistência à insulina? Eu sei que parece loucura porque estamos obviamente em meio a uma epidemia de obesidade”, afirma. E continua seu raciocínio: “Talvez devêssemos estar nos perguntando se é possível que a resistência a insulina gere ganho de peso e as doenças associadas à obesidade ao menos na maioria das pessoas?” 

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Os números podem estar do lado de Attia. Cerca de 30 milhões de americanos obesos não tem resistência à insulina, segundo ele. “Sabemos que seis milhões de pessoas magras nos Estados Unidos possuem resistência a insulina. E se estivermos lutando a batalha errada, brigando com a obesidade e não com a resistência a insulina? Pior, e se ao culparmos a obesidade estivermos culpando as vítimas? E se algumas das nossas principais ideias sobre obesidade estiverem simplesmente erradas?
Não é que Attia tenha a solução para a pergunta que ele mesmo coloca. Ele apenas possui uma hipótese, que precisa ainda ser cientificamente testada. “Se você se perguntar do que uma célula está tentando se proteger ao se tornar resistente à insulina, a resposta provavelmente não é de muita comida. É muito mais provável que seja de muita glicose, ou seja, muito açúcar no sangue. Sabemos que grãos refinados e amido elevam o açúcar no sangue no curto prazo. Então se você coloca esses processos fisiológicos para funcionar, eu faria a seguinte hipótese. Pode ser que nosso maior consumo de grãos refinados, açúcares e amido é que esteja levando, via resistência a insulina, à epidemia de obesidade e diabetes. E não necessariamente apenas o excesso de peso e a falta de exercício.”
Durante sua palestra, Attia disse que não vai descansar enquanto não entender o que é causa e o que é consequência na relação diabetes e obesidade. “O primeiro passo é aceitar a possibilidade de que o que acreditamos saber sobre obesidade, diabetes e resistência a insulina pode estar errado e consequentemente precisa ser testado. Estou apostando minha carreira nisso. Atualmente devoto todo o meu tempo a este problema e irei para onde a ciência me levar. Decidi que não posso e não vou mais fingir que tenho as respostas quando não as tenho”. 


*Alessandro Barros Greco é jornalista e engenheiro mecânico pela POLI-USP. Escreve sobre ciência desde 1998. Acredita que falar sobre ela ajuda as pessoas a viver melhor. Foi o terceiro brasileiro a receber a bolsa Knight Science Journalism Fellowship do Massachusetts Institute of Technology (MIT) 

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domingo, 21 de julho de 2013

Falha em equipamento ameaça a vida de diabéticos em Minas


Falha em equipamento ameaça a vida de diabéticos em Minas Aparelhos da marca Cepa GC distribuídos pela secretaria de saúde de Minas apresentam falha na medição de glicemia que leva os pacientes a aplicar mais insulina, com risco de morte .


"O Cepa não tem manual de instrução e os postos de saúde não foram instruídos sobre como usar o aparelho. Os resultados são discrepantes", Carol Freitas, relações-públicas 
Uma falha no aparelho que mede a glicemia da marca Cepa GC está pondo em risco a vida dos diabéticos em Minas. A leitura do glicosímetro não é homogênea como nos equipamentos de outras marcas e os resultados são bem mais elevados, o que leva o paciente a injetar mais insulina no sangue e há risco de coma hipoglicêmico. “Pode haver queda da glicemia abruptamente, porque é injetada uma quantidade excessiva de insulina”, alerta o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Diabéticos, o médico Levimar Rocha Araújo.
A entidade recebeu 15 reclamações esta semana no estado e houve outras na Faculdade de Ciências Médicas, em BH, onde Araújo é professor, e nas redes sociais. “Tivemos reclamações de médicos de Juiz de Fora, de pacientes de Campo Belo e de outras regiões. Médicos da capital detectaram também o problema no aparelho”, afirmou. “Pais de crianças diabéticas mandam e-mails e cartas e estou encaminhando tudo para a Secretaria de Estado de Saúde e outros órgãos competentes, mas não tivemos resposta”, reclama. Em Minas, a estimativa é de que haja 1,3 milhão de diabéticos com mais de 20 anos, cerca de 10% da população adulta, segundo o governo.

Três associações de diabéticos receberam denúncias também contra o Cepa: a Associação dos Diabéticos de BH, a de Diabéticos Infantis, também na capital, e a Associação dos Diabéticos de Campo Belo. “Uma mãe mediu a glicose do filho de 2 anos com o Cepa GC e deu quase 300. Ela tinha um aparelho antigo, foi conferir e deu 40. Se ela tivesse aplicado insulina, o menino poderia ter entrado em coma”, alertou a presidente e fundadora da Associação de Diabéticos Infantis, Cidinha Campos.

A Secretaria de Saúde de Campo Belo informou ter recebido várias reclamações do Cepa GC e que tem controlado o problema. O farmacêutico responsável testa os equipamentos levados pelas pessoas e os substitui quando necessário.
Os aparelhos Cepa GC foram importados pela Secretaria de Estado de Saúde e distribuídos gratuitamente à população desde outubro do ano passado. Por mês, as pessoas recebem 100 fitas usadas na medição. Segundo Levimar Araújo, a licitação para compra dos equipamentos é anual e o modelo anterior,  Accu-Chek Performa, foi substituído. “O estado compra os aparelhos e as fitinhas com valores mais baixos. O Cepa é de origem chinesa e ninguém o conhecia”, disse. O Accu-Chek Performa é mais eficiente, segundo ele, mas custa mais.
Precaução após erro
A relações-públicas Carol Freitas, de 34, que é diabética, deixou de usar o Cepa depois de medir a glicose que chegou a 500. “No aparelho antigo deu 130”, disse Carol, que passou a comprar por conta própria um pacote com 50 fitas do aparelho antigo por R$ 100. “Só que a gente gasta 150 fitas por mês”, protesta Carol, que já recebeu 250 reclamações do Cepa em seu blog, Doces contos de uma vida doce. “Enquanto no aparelho antigo a minha glicose dava 130, nesse dá 400, 500”, reclama.
A presidente da Associação dos Diabéticos de BH, Irma Pires de Oliveira, disse ter informações de que a fábrica do Cepa GC foi fechada e a fita não é encontrada para comprar no Brasil: “Foi uma firma que importou exclusivamente para o estado”. O presidente da Associação dos Diabéticos de Campo Belo, Rodrigo Dias, toma insulina todos os dias. “Quase entrei em coma por causa do resultado alterado do Cepa. O aparelho fez uma leitura para mais e tomei a insulina regular para diminuir a glicose, mas só que diminuiu duas vezes mais. Eu estava passando mal e minha mulher me socorreu aplicando uma glicose de ação rápida”, informou Rodrigo, explicando que a insulina baixa a glicose e que a aplicação aumenta a taxa de açúcar no sangue.

Farmacêutico

A Secretaria de Estado de Saúde (SES) admitu que o aparelho pode apresentar problemas de configuração e informou que cabe ao farmacêutico constatar se  ele está com defeito. “Quando ocorre problema com o aparelho, há um fluxo definido com as unidades para substituição. Mediante as informações apresentadas, pode-se verificar que é necessário encaminhar os pacientes que tenham dúvidas sobre a utilização dos aparelhos aos farmacêuticos municipais, para as devidas orientações e medidas cabíveis”, informou.
A SES disse ainda que adquire e distribui os glicosímetros e tiras reagentes de glicemia atendendo aos critérios de licitações públicas. “A distribuição da marca Cepa começou em outubro de 2012, após processo licitatório. Como o objetivo de orientar os profissionais de saúde no momento da entrega dos novos aparelhos aos pacientes, esta superintendência elaborou informe a todos os municípios. O objetivo é divulgar e uniformizar orientações sobre o uso correto dos novos aparelhos, uma vez que se identificou que o uso inadequado e a falta de configuração foram as principais causas das diferenças de medida”, diz a nota.
Também por meio de nota, a Secretaria de Saúde de BH (SMSA) informou que distribui glicosímetros da marcha Roché. Já o Cepa GC é entregue desde a segunda quinzena de fevereiro e que já registrou 50 reclamações de pacientes sobre divergências na medição. “Nesta semana, a SMSA recebeu da SES a solução padrão que permite a testagem do glicossímetro. Todas as pessoas que encaminharam reclamações serão chamadas para testagem de seus glicosímetros. Caso sejam identificados problemas será solicitada a troca pela SMSA”, diz a nota.