Falha em equipamento ameaça a vida de diabéticos em Minas
Aparelhos da marca Cepa GC distribuídos pela secretaria de saúde de Minas
apresentam falha na medição de glicemia que leva os pacientes a aplicar mais
insulina, com risco de morte .
"O Cepa não tem manual de instrução e os postos de
saúde não foram instruídos sobre como usar o aparelho. Os resultados são
discrepantes", Carol Freitas, relações-públicas
Uma falha no aparelho que mede a glicemia da marca Cepa GC
está pondo em risco a vida dos diabéticos em Minas. A leitura do glicosímetro
não é homogênea como nos equipamentos de outras marcas e os resultados são bem
mais elevados, o que leva o paciente a injetar mais insulina no sangue e há
risco de coma hipoglicêmico. “Pode haver queda da glicemia abruptamente, porque
é injetada uma quantidade excessiva de insulina”, alerta o vice-presidente da
Sociedade Brasileira de Diabéticos, o médico Levimar Rocha Araújo.
A entidade recebeu 15 reclamações esta semana no estado e
houve outras na Faculdade de Ciências Médicas, em BH, onde Araújo é professor,
e nas redes sociais. “Tivemos reclamações de médicos de Juiz de Fora, de
pacientes de Campo Belo e de outras regiões. Médicos da capital detectaram
também o problema no aparelho”, afirmou. “Pais de crianças diabéticas mandam
e-mails e cartas e estou encaminhando tudo para a Secretaria de Estado de Saúde
e outros órgãos competentes, mas não tivemos resposta”, reclama. Em Minas, a
estimativa é de que haja 1,3 milhão de diabéticos com mais de 20 anos, cerca de
10% da população adulta, segundo o governo.
Três associações de diabéticos receberam denúncias também
contra o Cepa: a Associação dos Diabéticos de BH, a de Diabéticos Infantis,
também na capital, e a Associação dos Diabéticos de Campo Belo. “Uma mãe mediu
a glicose do filho de 2 anos com o Cepa GC e deu quase 300. Ela tinha um
aparelho antigo, foi conferir e deu 40. Se ela tivesse aplicado insulina, o
menino poderia ter entrado em coma”, alertou a presidente e fundadora da
Associação de Diabéticos Infantis, Cidinha Campos.
A Secretaria de Saúde de Campo Belo informou ter recebido
várias reclamações do Cepa GC e que tem controlado o problema. O farmacêutico
responsável testa os equipamentos levados pelas pessoas e os substitui quando
necessário.
Os aparelhos Cepa GC foram importados pela Secretaria de
Estado de Saúde e distribuídos gratuitamente à população desde outubro do ano
passado. Por mês, as pessoas recebem 100 fitas usadas na medição. Segundo
Levimar Araújo, a licitação para compra dos equipamentos é anual e o modelo
anterior, Accu-Chek Performa, foi
substituído. “O estado compra os aparelhos e as fitinhas com valores mais
baixos. O Cepa é de origem chinesa e ninguém o conhecia”, disse. O Accu-Chek
Performa é mais eficiente, segundo ele, mas custa mais.
Precaução após erro
A relações-públicas Carol Freitas, de 34, que é diabética,
deixou de usar o Cepa depois de medir a glicose que chegou a 500. “No aparelho
antigo deu 130”, disse Carol, que passou a comprar por conta própria um pacote
com 50 fitas do aparelho antigo por R$ 100. “Só que a gente gasta 150 fitas por
mês”, protesta Carol, que já recebeu 250 reclamações do Cepa em seu blog, Doces
contos de uma vida doce. “Enquanto no aparelho antigo a minha glicose dava 130,
nesse dá 400, 500”, reclama.
A presidente da Associação dos Diabéticos de BH, Irma Pires
de Oliveira, disse ter informações de que a fábrica do Cepa GC foi fechada e a
fita não é encontrada para comprar no Brasil: “Foi uma firma que importou
exclusivamente para o estado”. O presidente da Associação dos Diabéticos de
Campo Belo, Rodrigo Dias, toma insulina todos os dias. “Quase entrei em coma
por causa do resultado alterado do Cepa. O aparelho fez uma leitura para mais e
tomei a insulina regular para diminuir a glicose, mas só que diminuiu duas
vezes mais. Eu estava passando mal e minha mulher me socorreu aplicando uma
glicose de ação rápida”, informou Rodrigo, explicando que a insulina baixa a
glicose e que a aplicação aumenta a taxa de açúcar no sangue.
Farmacêutico
A Secretaria de Estado de Saúde (SES) admitu que o aparelho
pode apresentar problemas de configuração e informou que cabe ao farmacêutico
constatar se ele está com defeito.
“Quando ocorre problema com o aparelho, há um fluxo definido com as unidades
para substituição. Mediante as informações apresentadas, pode-se verificar que
é necessário encaminhar os pacientes que tenham dúvidas sobre a utilização dos
aparelhos aos farmacêuticos municipais, para as devidas orientações e medidas
cabíveis”, informou.
A SES disse ainda que adquire e distribui os glicosímetros e
tiras reagentes de glicemia atendendo aos critérios de licitações públicas. “A
distribuição da marca Cepa começou em outubro de 2012, após processo
licitatório. Como o objetivo de orientar os profissionais de saúde no momento
da entrega dos novos aparelhos aos pacientes, esta superintendência elaborou
informe a todos os municípios. O objetivo é divulgar e uniformizar orientações
sobre o uso correto dos novos aparelhos, uma vez que se identificou que o uso
inadequado e a falta de configuração foram as principais causas das diferenças
de medida”, diz a nota.
Também por meio de nota, a Secretaria de Saúde de BH (SMSA)
informou que distribui glicosímetros da marcha Roché. Já o Cepa GC é entregue
desde a segunda quinzena de fevereiro e que já registrou 50 reclamações de
pacientes sobre divergências na medição. “Nesta semana, a SMSA recebeu da SES a
solução padrão que permite a testagem do glicossímetro. Todas as pessoas que
encaminharam reclamações serão chamadas para testagem de seus glicosímetros.
Caso sejam identificados problemas será solicitada a troca pela SMSA”, diz a
nota.
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