Quem
pode ter diabetes tipo 1?
Embora a doença geralmente comece em pessoas com menos de 20 anos, o
diabetes tipo 1 (antigamente conhecido como “diabetes insulino-dependente”)
pode ocorrer em qualquer idade. A doença é relativamente incomum, afetando
cerca de 1 em cada 250 pessoas. O diabetes tipo 1 é mais comum em brancos
que em negros e afeta igualmente homens e mulheres. Os pacientes com
diabetes tipo 1 correspondem a menos de 10% de todos os casos de diabetes
na população. 90% (ou mais) dos casos de diabetes são do tipo 2.
Quais
são as causas do diabetes tipo 1?
Ainda não são conhecidos todos os fatores que provocam o diabetes tipo 1. O
que se sabe é que a possibilidade de apresentar a doença é claramente
herdada - ou seja, depende de fatores genéticos. Outro fato que
já foi identificado é que existem alguns fatores externos (os chamados “gatilhos”)
que desempenham um papel no aparecimento da doença.
Assim, o diabetes tipo 1 parece ocorrer quando alguma coisa no ambiente -
uma toxina, ou um vírus, ou mesmo um quadro de stress psicológico muito
intenso - serve como “gatilho” para desencadear uma resposta exagerada do
sistema imunológico, que lança um ataque contra uma parte do próprio
organismo do paciente: o pâncreas, levando à destruição das células
beta pancreáticas, responsáveis pela produção de insulina.
Depois de um determinado nível de agressão, o paciente não consegue mais
produzir a própria insulina, e passa a apresentar as características
clínicas da deficiência de insulina: aumento da glicemia no sangue,
desequilíbrio dos níveis de colesterol e triglicerídeos, perda de peso etc.
Assim, a diabetes surge da interação entre um fator ambiental - o “gatilho”
- com os fatores genéticos, que aumentam a probabilidade de uma determinada
pessoa apresentar um comportamento anormal do sistema imunológico, com
danos às próprias células das ilhotas pancreáticas.
Alguns marcadores desse ataque imunológico podem ser encontrados no sangue
da maioria das pessoas que desenvolvem diabetes tipo 1: são os chamados auto-anticorpos.
Eles podem ser detectados em até 90% dos pacientes, geralmente no início da
doença.
Uma vez que a diabetes tipo 1 tem uma natureza auto-imune -
ou seja, é causada pelo ataque do sistema imunológico às estruturas do
próprio organismo do paciente - é muito comum a sua ocorrência em conjunto
com outras doenças auto-imunes, tais como: o hipertireoidismo (doença de
Graves), o hipotireoidismo, a insuficiência adrenal, o vitiligo e a
falência ovariana prematura (ooforite auto-imune, ou destruição auto-imune
dos ovários).
Quais
são os sintomas do diabetes tipo 1?
Os sintomas são muitas vezes leves e sutis, mas podem ser muito mais
severos (principalmente no início da doença). Alguns sintomas clássicos
são:
-
sede excessiva;
- fome excessiva (especialmente após as alimentações);
- boca seca;
- náuseas e vômitos;
- dor abdominal;
- necessidade de urinar muitas vezes e em grandes quantidades;
- perda de peso sem explicação (mesmo comendo bastante e sentindo fome);
- cansaço e fraqueza;
- visão borrada;
- respiração difícil e pesada;
- infecções muito freqüentes da urina, vagina (candidíase vaginal) ou da
pele.
Os
sinais que indicam uma emergência no diabetes tipo 1 - ou seja, a
necessidade de atendimento médico imediato - são os seguintes:
-
tremores e confusão;
- respiração pesada, difícil, acelerada;
- mau hálito (cheiro de “maçãs podres”);
- dor abdominal intensa;
- perda de consciência (incomum).
Como
é feito o diagnóstico de diabetes tipo 1?
Na suspeita de diabetes, o principal exame para confirmar o diagnóstico é a
dosagem de glicose (açúcar) no sangue, também chamada glicemia.
Além disso, pode-se encontrar alterações no exame de urina, como a presença
de glicose (que normalmente não é excretada na urina) ou de corpos
cetônicos. No momento, não há nenhum exame preventivo que seja útil para
rastrear ou avaliar com antecedência a possibilidade de uma determinada
pessoa desenvolver o diabetes tipo 1. O diagnóstico é feito apenas após o
aumento da glicemia - ou seja, depois que a doença já está instalada.
Como
é o tratamento?
Muitas pessoas com diabetes tipo 1 têm vidas longas e saudáveis. A chave
para manter a boa saúde é manter os níveis de glicemia sempre dentro dos
valores considerados como alvo. Quem determina esses valores-alvo de
glicemia é o médico, mas geralmente os valores desejáveis para a glicemia
são os valores normais ou o mais próximo possível do normal - ou seja,
entre 80 e 140 mg/dL.
Atingir e manter esses valores é uma meta que pode ser alcançada com o
planejamento cuidadoso das refeições, da prática de exercícios físicos e do
uso de insulina. Todos os pacientes com diabetes tipo 1
precisam usar injeções de insulina (geralmente 2 a 4 doses por dia) para
controlar sua glicose sangüínea, uma vez que seus organismos não são
capazes de produzir a própria insulina, como ocorre em pessoas sem
diabetes.
Também é preciso medir os níveis de glicose regularmente e fazer ajustes na
insulina, alimentação e atividades para manter a glicemia normal no
dia-a-dia.
Quais
são as complicações do diabetes tipo 1?
Se os níveis de glicose não forem adequadamente controlados, o diabetes
tipo 1 pode provocar uma série de problemas incômodos e potencialmente
fatais. Felizmente, tais complicações podem ser prevenidas pelo tratamento
correto e pela manutenção de níveis normais ou quase-normais de glicemia.
As principais complicações do diabetes são as seguintes:
a)
Retinopatia - É uma doença da parte de trás dos olhos (as
retinas), que pode afetar até 80% dos adultos que tenham diabetes tipo 1 há
mais de 15 anos. A retinopatia diabética é extremamente rara antes da
adolescência, não importando há quanto tempo a pessoa seja portadora de
diabetes. O controle adequado da glicemia, o manejo da hipertensão e a
regulação dos lípides sangüíneos (colesterol e triglicérides) são
importantes medidas na prevenção da retinopatia. Felizmente, a perda de
visão não costuma ser importante ou incapacitante na maioria dos pacientes.
Casos mais avançados de retinopatia diabética podem ser tratados com
sessões de laser (fotocoagulação), para prevenir a
piora da perda de visão. Todo paciente com mais de 5 anos de diabetes tipo
1 deve fazer, uma vez por ano, um exame especial para avaliar o
comprometimento da retina: é o chamado exame defundo-de-olho, ou fundoscopia.
b)
Nefropatia - Cerca de 35 a 45% das pessoas com diabetes tipo 1
desenvolvem uma doença dos rins, chamada nefropatia diabética.
O risco para doença renal aumenta com o passar do tempo e se torna mais
importante após 15 a 25 anos de diabetes. Os rins passam a funcionar menos,
podendo até chegar à falência completa - a chamada insuficiência
renal, que em alguns casos obriga o paciente a fazer sessões de
hemodiálise ou diálise peritoneal para substituir a função dos rins. Essa
complicação também pode ser prevenida pelo controle glicêmico adequado e o
tratamento correto da hipertensão arterial e do colesterol. Infelizmente,
diabéticos com nefropatia apresentam um risco muito elevado de outras
doenças sérias, como o infarto do miocárdio e a retinopatia. O primeiro
sinal de nefropatia diabética, na maioria dos casos, é o aumento da perda
de proteínas, principalmente a albumina, na urina. Por isso,
pacientes com diabetes tipo 1 há mais de 5 anos devem fazer todos os anos
um exame que avalie a perda de albuminúria na urina, o que é feito com
coleta de toda a urina produzida durante 12 ou 24 horas.
c)
Neuropatia - O diabetes pode afetar também os nervos,
principalmente em extremidades do corpo como os pés e as mãos - uma
complicação conhecida comoneuropatia diabética. O dano aos nervos
provoca alterações da sensibilidade, sendo que os pés e mãos podem
tornar-se mais insensíveis (“dormentes”) e deixar de sentir calor, frio ou
dor. Assim, o paciente com neuropatia pode machucar os pés e não sentir dor
nenhuma, o que aumenta o risco de infecção, bolhas, calos, deformidades e
até mesmo de amputação. Outros sintomas de neuropatia podem ser: dor em
queimação nas plantas dos pés, principalmente à noite; formigamento,
pontadas, cãibras nas pernas, etc. A neuropatia, assim como a nefropatia e
a retinopatia, podem ser prevenidas pelo adequado controle da glicemia. Há
várias medicações que podem aliviar os sintomas da neuropatia, uma vez que
ela esteja instalada, tais como: a carbamazepina, a amitriptilina e a
gabapentina.
Além dos pés e mãos, outros órgãos também podem ser acometidos pela
neuropatia, tais como: o trato digestivo (provocando náuseas, vômitos,
diarréia e/ou má-digestão); o coração (levando a variações muito grandes da
pressão arterial), e o sistema genito-urinário (podendo causar perda ou
retenção de urina e impotência sexual).
d)
Má circulação - Os vasos sangüíneos de todo o corpo,
principalmente as artérias, também podem ser afetados pelo diabetes tipo 1,
levando a problemas de circulação principalmente nas extremidades (pés).
Com isso, a cicatrização de feridas é muito comprometida. A má circulação,
associada à perda de sensação dolorosa característica da neuropatia, leva
ao aparecimento do chamado pé diabético - um pé frágil,
com grandes chances de complicações sérias como: infecção, gangrena,
necrose e amputação. O pé diabético é uma das maiores causas de amputações
em membros inferiores (pés, pernas) na atualidade.
O
que é a “bomba de insulina”?
Bombas de insulina são aparelhos computadorizados, pequenos (mais ou menos
do tamanho de um celular), que são utilizados para injetar insulina
continuamente em pacientes diabéticos. As bombas geralmente são usadas numa
espécie de cinto (ou “pochette”), ou mesmo no bolso da vestimenta, de uma
forma discreta. Elas possuem um tubo fino e flexível (chamado “cateter”)
com uma agulha fina na ponta. Essa agulha é inserida abaixo da pele do
abdome (no tecido subcutâneo) e fixada com uma fita adesiva.
A bomba de insulina é desenhada para liberar insulina através do cateter
até o subcutâneo do paciente constantemente - isto é, durante as 24 horas
do dia - com o objetivo de controlar rigorosamente os níveis de glicemia.
Essa infusão contínua, durante o dia todo, é chamada de “taxa basal” de
insulina. Quando o paciente faz uma refeição, a bomba pode ser programada
para liberar uma dose maior de insulina com o objetivo de controlar o
aumento de glicose determinado pela ingestão de alimentos. Essa infusão
aumentada de insulina, apenas nos horários das refeições, é chamada de
“bolus”. Cada paciente pode calcular, em conjunto com seu médico, quanto de
insulina vai ser injetada na forma de taxa basal e de bolus, para permitir
o controle mais perfeito possível dos níveis de glicose.
O cateter e a agulha são geralmente mantidos no lugar durante 48 ou 72
horas, quando precisam ser trocados. A insulina utilizada deve ser de ação
rápida (regular, lispro ou aspart - veja em “ Medicamentos”
quais os tipos de insulina que existem). O paciente deve fazer medidas de
glicemia capilar pelo menos 4 vezes por dia durante o uso da bomba.
A bomba de insulina é um método efetivo para controle da glicemia, já que
permite um controle muito bom. Além disso, é segura e confortável, já que
elimina a necessidade de múltiplas injeções de insulina. Por isso, ela é
muito utilizada em pacientes que precisam de um controle muito rigoroso da
glicemia (grávidas diabéticas, por exemplo) ou por pessoas que estejam
altamente motivadas para um controle glicêmico estrito. Sua maior limitação
é o alto custo, que torna seu uso muito restrito no Brasil.
O
que é o “transplante de ilhotas” e como funciona?
O transplante de ilhotas é a retirada das células beta do pâncreas (as
células que produzem insulina) de um doador e seu implante em uma pessoa
com diabetes. Nos casos de sucesso, as células beta do doador começam a
produzir insulina no corpo da pessoa que recebe o transplante e esta fica
livre das injeções diárias de insulina. De fato, o transplante de ilhotas
pode melhorar muito a qualidade de vida das pessoas com diabetes e prevenir
diversas complicações da doença.
Entretanto, como acontece com qualquer outro transplante de órgãos ou
tecidos, o maior desafio é a rejeição do transplante pelo receptor. O
sistema imunológico da pessoa que recebe o transplante pode reconhecer as
células do doador como “estranhas” e passar a atacá-las. Quando esse ataque
causa lesão ao transplante (podendo levar à perda do mesmo), esse fenômeno
é conhecido como “rejeição”. Para evitar a rejeição, os receptores do
transplante são obrigados a tomar, pelo resto das suas vidas, medicações
para inibir a atividade do sistema imunológico. Muitas dessas medicações
têm sérios efeitos colaterais, e o seu uso prolongado pode provocar
complicações importantes como infecções e alguns tipos de câncer. Além
disso, ainda não são todos os casos de transplante de ilhotas que
apresentam sucesso. Mas novas drogas imunossupressoras e novas técnicas de
transplante estão sendo desenvolvidas, que podem permitir o uso mais
disseminado dessa forma de tratamento no futuro.
Por enquanto, o transplante de ilhotas ainda é uma técnica experimental e
restrita a alguns grandes centros médicos no mundo. Pacientes que podem se
beneficiar do transplante de ilhotas incluem aqueles com idade entre 18 e
65 anos, com diabetes tipo 1 há mais de 5 anos, que estejam enfrentando complicações
sérias do diabetes, tais como hipoglicemias severas e freqüentes, ou que
apresentem doença renal (nefropatia) com possível necessidade de diálise.
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