quarta-feira, 2 de março de 2016

O IMPACTO DA FÉ NO TRATAMENTO DO DIABETES




O diabetes é frequentemente uma doença insidiosa que não se manifesta explosivamente mas que, uma vez identificado, torna-se uma condição permanente que pode ser controlada mas ainda não pode ser curada. O mau controle do diabetes, decorrente de tratamentos inadequados e de adesão apenas parcial às recomendações médicas é o fator responsável pelas complicações crônicas da doença. Um artigo publicado em 2013, sob o título de “Diabetes, religião e espiritualidade” traz uma abordagem inteligente sobre como a fé pode impactar positivamente a evolução do diabetes, em sintonia com intervenções educacionais, psicológicas e farmacológicas. Atualmente, com o aumento da prevalência de doenças não comunicáveis, como o diabetes, o modelo biomédico da doença precisa ser expandido para um modelo biopsicossocial, onde a espiritualidade e a religião sejam partes integrantes do bem-estar das pessoas afetadas e precisam ser incorporadas de acordo com as necessidades individuais de cada paciente. Em condições médicas nas quais o autocontrole é um componente crucial da abordagem terapêutica, é preciso compreender a importância da aderência do paciente e esta, por sua vez, depende essencialmente de mecanismos motivacionais que ajudem o paciente a enfrentar os desafios impostos por sua condição de saúde prejudicada.[1]

Ao invés de um debate inútil entre a comunidade científica e os agentes religiosos, os esforços devem ser dirigidos à construção de estratégias conjuntas e complementares nas quais cada lado deve respeitar o domínio do lado oposto, desde que sejam respeitados os princípios científicos, éticos e morais que devem reger tal associação. Dentro dessa perspectiva de uma ação colaborativa e inteligente entre ciência, religião e espiritualidade, algumas posturas devem ser corrigidas para que se consiga promover um impacto sadio, ético e sustentável para esse louvável esforço conjunto dessas ações. Exemplificando: principalmente nos últimos anos, vem se tornando uma lamentável realidade a intromissão de setores religiosos nas recomendações médicas que regem a boa conduta terapêutica absolutamente indispensável para se promover o bom controle do diabetes. Em outras palavras, as orientações de religiosos e de outros agentes leigos no sentido de que o tratamento farmacológico não seria necessário uma vez que a intervenção divina seria capaz de promover a “cura” milagrosa do diabetes constitui-se em atitude reprovável e com possíveis implicações éticas e legais.
Um exemplo vivo dos riscos de recomendações visando a suspensão do tratamento farmacológico de pacientes com diabetes pode ser visto no filme “Promised a Miracle”, baseado numa história real, que pode ser assim resumida: os pais de uma criança de onze anos, portadora de diabetes tipo 1 e em tratamento insulínico permanente, acabam se influenciando pela comunidade religiosa que frequentavam e acabaram por suspender o tratamento insulínico da criança, uma vez que Deus se encarregaria de curá-la. Evidentemente, a pobre criança acaba morrendo e os pais acabaram condenados por homicídio culposo. Vale a pena assistir a este comovente filme lançado em 1988 e que talvez você ainda encontre em sua locadora de vídeo.

Comentário final: a intervenção religiosa bem orientada pode ser uma das estratégias mais bem sucedidas para a promoção do bom controle do diabetes. Para o aumento da eficácia das intervenções educacionais e motivacionais a ação integrada dessas duas vertentes pode trazer uma contribuição inestimável para a população de pessoas com diabetes num país como o Brasil, onde apenas 10% dos pacientes com diabetes tipo 1 e 23% dos pacientes com diabetes tipo 2 apresentam controle adequado da doença.

Referência bibliográfica:

1.Sridhar GR. Diabetes, religion and spirituality. Int J Diabetes Dev Ctries (January-March 2013);33(1):5-7.

Observação: esse artigo poderá ser acessado gratuitamente através do DOI (Digital Object Identifier): 10.1007/s13410-012-0097-8.

http://www.diabetes.org.br/ultimas/1253-o-impacto-da-fe-no-tratamento-do-diabetes



Informações do Autor


Dr. Augusto Pimazoni-Netto
Coordenador do Grupo de Educação e Controle do
Diabetes do Hospital do Rim e 
Hipertensão da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP

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