Da angústia de uma mãe, nasce um projeto de saúde premiado
Orientação a crianças diabéticas está entre os projetos da ONG comandada por Cláudia
Lanche errado na escola pode ser fatal para uma criança que sofre de diabetes. Tudo precisa ser controlado: refeições, exercícios físicos, medicamentos.
De angústias como esta, que amedrontam toda mãe de criança diabética, nasceu um projeto inovador. A proposta, recém premiada, é fazer do celular o “anjo da guarda” de quem tem de aprender o que é ter uma doença crônica antes mesmo de ir para o colégio.
Tudo começou com o Léo. Ele tinha apenas 3 anos e uma dor de ouvido que não cessava. Cláudia Filatro, mãe de primeira viagem do menino, tinha certeza de que era uma daquelas otites infantis danadas de fortes. Errou. Assim como os três médicos que viram o garoto. Era mesmo diabetes, palavra tão adulta para meninos tão pequenos.
Do diagnóstico de Léo surgiu a vontade de ajudar outras mães que passavam por situação semelhante. Sete anos passaram, o filho já é um “homenzinho” de 10 anos – e com diabetes controlado – e Cláudia conseguiu muita coisa neste período. Deixou de lado a profissão de decoradora de interiores para se dedicar à causa. Criou uma ONG especializada em diabete infantil (Pró- Criança e Jovem Diabético JD) e um dos últimos projetos desenvolvidos por ela, com a chancela de especialistas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Pontifícia Católica (PUC), acaba de ser premiado.
Concorrendo com outras 1.000 propostas, a ideia batizada de Zelous ganhou primeiro lugar no concurso OI Novos Brasis, promovido pelo Instituto Oi Futuro para patrocinar projetos que melhorem a vida da população. Com o patrocínio, já está no “forno” para virar realidade em 2011. Se tudo der certo, a tecnologia dos telefones celulares será parceira de quem sofre desde cedo de uma doença crônica, sem cura e segundo estimativas da Sociedade Brasileira do Diabetes, cresce cerca de 3% ao ano na população infantil.
"Dr. Celular"
Cláudia, em parceria com o médico Renato Sabbatini – professor da Unicamp, presidente o Instituto de Educação em Medicina e especializado em ferramentas de comunicação em favor da saúde – elaborou um software para celular que ajuda na prevenção, na gestão e no controle do diabetes infantil. Por meio de mensagens de texto, os pais ou cuidadores serão avisados dos horários das medicações e das refeições, receberão receitas específicas para diabéticos, dicas de nutrição, agenda de consultas e poderão trocar informações com a equipe médica, a qualquer hora – medidas simples, mas que previnem as principais sequelas do diabetes descontrolado, como exemplo morte cardíaca e convulsão.
“Servirá para a troca de informações entre o médico e o paciente e também uma forma de deixar o prontuário do paciente online”, conta Sabbatini.
O projeto-piloto desta espécie de “Dr. Celular” será conduzido com uma equipe multidisciplinar da PUC-Campinas e testado em 20 pacientes. Todos os médicos ganharão netbooks e as crianças acompanhadas um aparelho celular. Os resultados devem ser conhecidos em novembro do próximo ano.
Doença de difícil controle
A importância de criar ferramentas que ajudem no controle da doença que é líder em causa de morte já foi reforçada por pesquisas. Estudo feito por pesquisadores ligados à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), à Fundação Oswaldo Cruz e ao Centro de Controle do Diabetes da Bahia revelou que 76% dos diabéticos não conseguem manter as taxas glicêmicas adequadas, o que aumenta os riscos de panes cardiovasculares, infartos e derrames.
A pesquisa foi feita 6.671 adultos, mas os especialistas afirmam que, apesar de ainda não ter sido calculado, o índice de descontrole do diabetes entre as crianças deve ser ainda maior. “Certamente a dificuldade em controlar a doença na população infantil é maior porque precisa de um envolvimento em sintonia dos pais (cuidadores), professores, médicos, enfermeiros. É uma gestão difícil”, afirma Sabbatini.
Os piores desfechos estão relacionados ao descontrole do diabetes infantil, já alertou a experiência na presidência da ONG JD. Cláudia Filatro conta que eram frequentes os relatos de pais que viram os filhos ficarem surdos e cegos por dificuldades para tratar a doença. Outras crianças que chegaram à entidade sofriam desmaios constantes pelo simples fatos de não comerem a cada três horas. Outros pais falhavam na aplicação de medicação, porque se esqueciam de retirar a insulina do congelador três horas antes da aplicação. “Pequenas tarefas que podem ser agora organizadas via celular”, acredita Cláudia.
Diabetes também é assunto de criança
As crianças quando cruzam com qualquer tipo de diabetes vivem driblando as complicações clínicas. Estudo da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica afirmou, por exemplo, que 17% dos diabéticos sofrem de depressão. Doenças cardíacas também mostram perigo. Crianças e adolescentes com diabetes estão no topo da lista de risco cardiovascular segundo a Associação Americana do Coração (AHA – sigla em inglês).
Existem dois tipos de diabetes. O chamado tipo 1 é o mais frequente na população infantil. Causado por influência genética, exige a ingestão de insulina de duas a três vezes por dia e uma dieta com privações de doces e açúcar. Já o tipo 2 está relacionado aos hábitos alimentares ruins e aparece “de mãos dadas” com a obesidade.
Hoje, o tipo 2 também passou a ameaçar a saúde de crianças e adolescentes. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) 155 milhões de jovens estão obesos no mundo. No Brasil, mostrou levantamento da Universidade de Brasília, a parcela de obesos mirins cresceu 240% nas últimas duas décadas. Hoje, em média, 10% das crianças e adolescentes estão com o peso em desacordo com a idade.
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